Saturday, August 04, 2007

Texto 19 – ANJOS, F. S. dos; CALDAS, N. V. Pluriatividade e Ruralidade: falsas premissas e falsos dilemas. In: O novo rural brasileiro: novas ruralidades e urbanização. Brasília, DF: Embrapa Informação Tecnológica, 2004. p. 72-105.

No contraponto das teses que apontavam para um índice de urbanização semelhante aos países desenvolvidos, a partir de um “paradigma da modernização”, onde o “ocaso dos campos” era algo inevitável, os autores recuperaram o processo de discussão ocorrido desde os anos 80, em relação à visão da ruralidade. Nesse aspecto, tornava-se necessário redefinir o papel dos novos atores no campo em diferentes contextos tanto no Brasil como no exterior, além da descoberta da importância das atividades não agrícolas no meio rural. Para isso, eles se propõem a mostrar a trajetória da construção do conceito de “pluriatividade” e as diferentes teses muitas das quais conflitivas e equivocadas. Por fim, os obstáculos que este novo enfoque de desenvolvimento rural tem à luz da legislação brasileira. Como esforço central dos autores pode-se dizer que é a identificação dos fatos que fazem surgir a pluriatividade e as características do processo de transformação rural que a pluriatividade determina.
Como “pluriatividade” é definido: “a atribuição de novos papéis aos territórios no contexto de uma sociedade pós-industrial, plenamente abastecida de alimentos e matérias primas, e que simultaneamente reivindica um melhor uso dos recursos econômicos, ecológicos e sociais”. Os autores mostram como a “agricultura de tempo parcial”, nos anos 70, considerada como um fenômeno de transição para a modernidade, passa a constituir como pauta de reivindicação de entidades como a Modef e a CNSTP na França e a Confcoltivatori na Itália. Nesse aspecto, percebe-se, primeiramente nos países desenvolvidos, a transição do paradigma da modernização produtivista para o paradigma da multifuncionalidade.
No Brasil a questão da pluriatividade começa a partir da constatação de que o emprego rural não-agrícola cresce mais do que o emprego agrícola. Entretanto estes estudos ficam restritos à região sul. Surge o “Projeto Rurbano” que reafirma o “novo rural brasileiro” entendido como a ampliação das atividades não-agrícolas no campo e da pluriatividade praticada pelos residentes no meio rural e a constatação de que o fator mais importante para segurar a população no meio rural durante a década de 90 foram as atividades não agrícolas.
Os autores apresentam as falsas teses sobre a pluriatividade.
- a “multiocupação” causada pelo desemprego estrutural e a crise da sociedade pós-industrial produziram situações de “auto-emprego”;
- A “desdiferenciação” que é o caso de agricultores patronais que exercem outras funções não agrícolas ou auferirem rendas provenientes de outras atividades (pecuária, por exemplo);
- o vínculo da “pluriatividade” na questão da agricultura familiar aos processos de industrialização regional que recruta grandes contingentes de mão-de-obra das atividades agrícolas.
Por isso, a idéia da “pluriatividade” deve superar a questão da industrialização regional e reconhecer outras atividades como o turismo rural, o lazer, a indústria doméstica rural, ou até a prestação de serviços.
Os autores nos mostram que até o final dos anos 70 o conceito de pluriatividade foi utilizado associado às explorações agrícolas decadentes, sem condições de participar do circuito tecnológico moderno. A partir daí, nos mostram as conclusões do “Arkleton Project” que apresenta a pluriatividade como instrumento que permite compreender as transformações da estrutura agrária européia sob um determinado contexto social e econômico. Apresentam o conceito de Uttiz de “estilos de vida” como recurso para compreender o processo familiar de tomada de decisão em função de determinações externas complexas, que permite entender como explorações pluriativas caminham para uma produção “monoativa” e vice-versa. Com esse referencial teórico, os autores estudam o comportamento social de produtores de arroz no litoral sul de Santa Catarina no que diz respeito à dinâmica da participação da força de trabalho e a influência da presença de uma forte atividade industrial têxtil, como força exógena à agricultura familiar, mas que influencia na presença da mão de obre familiar nas atividades essencialmente agrícolas, em especial as mulheres e os jovens.
Sob a luz do materialismo histórico os autores justificam a pertinência da pluriatividade e da diversificação no atual modelo agrário e agrícola contemporâneo e a própria “desdiferenciação” como forma de sustentabilidade dessa atividade produtiva.
A crítica à teoria do “refúgio” é contestada sob a argumentação do custo de oportunidade do fator trabalho que permite ao agricultor familiar ir atrás de melhores oportunidades de aumento da receita familiar em atividades não essencialmente agrícolas. Os autores concluem dizendo que a “desagrarização” não significa “desruralização”.
Para concluir, discutem o papel da reforma agrária no Brasil e as posições que consideram a sua vocação strictamente agrícola. Para os autores, a pluriatividade é um desafio que pode contribuir no processo de desenvolvimento territorial =FIM=

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