Friday, November 23, 2007

Texto 20: CARVALHO, H. M. de. A emancipação do movimento no movimento de emancipação social continuada (resposta a Zander Navarro). In: Produzir para viver: os caminhos da produção não capitalista. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 2002 pp.233-260

Carvalho recupera a história do MST desde a sua fundação, em 1984, Cascavel, PR, no I Encontro Nacional e faz uma avaliação do significado desses 16 anos de lutas, que culminou com o IV Congresso Nacional, em agosto de 2000, em Brasília. Nessa avaliação, realça a renovação enquanto movimento social de massa, que vem obrigando as classes dominantes a repensarem o papel das classes subalternas no campo.
O autor valoriza o “jeito de ser e fazer” do MST. Cita os inimigos históricos do Movimento, a saber: a) a aliança histórica das classes dominantes com o empresariado; b) os governos federal e estaduais, através da manipulação de políticas públicas e meios de comunicação de massa contra os interesses das classes subalternas; c) as forças para-militares; d) as agências multilaterais de desenvolvimento (BIRD e BID) e os paradigmas do FMI; e) amplos setores da intelectualidade de centro-esquerda que, pelo desencanto pessoal ou pela cooptação pela classe dominante aderiram à ideologia de considerar os pequenos produtores rurais familiares simplesmente como setor de produção, sem perspectiva histórica e cita diferentes apoios nacionais e internacionais existentes em relação ao MST. Para concluir este bloco, o autor considera a importância do rompimento com a tutela da igreja e de outras forças sócias.
A seguir, passa a descrever o que considera os “segredos íntimos” do MST. Para iniciar, mostra o processo dialético existente no processo de emancipação social, seja no nível pessoal, grupal ou social, que está em movimento e se fazendo, portanto, é sempre incompleto. Como um caleidoscópio, cada mudança no contexto social vai forjando novas formas de relações de tutela e emancipações sociais se dão sob novas formas. Contrariamente às afirmativas de Navarro, Horácio afirma que os movimentos de massas, em suas ações diretas, não demandam mediações formais de representação de interesses e que o MST é um exemplo dessa emancipação social moldando uma nova identidade social dos trabalhadores rurais sem terra. Que as ações diretas, a pedagogia própria, a formação de militantes, a forma de governo (coordenação) nos assentamentos, as místicas e os valores construídos na luta redefinem as relações entre estado e sem-terras. Além disso, o MST já surge com a necessidade de emancipar-se das tutelas da igreja católica e dos sindicatos que ajudaram em sua organização inicial, sem a perda da solidariedade e cooperação. Internamente o Movimento deveria superar o centralismo burocrático.
Quanto aos princípios de organização estabelecidos no I Encontro Nacional de 1984, estes já apontavam para o caráter de massa, a saber: a direção coletiva, a divisão de tarefas, a disciplina, o estudo, a formação de quadros, a luta de massa e a vinculação com a base. Além disso, no processo de movimento, foi incorporado como princípio fundamental a ocupação de terras como forma de luta direta. Somando-se à autonomia do Movimento e à característica de sociedade organizada em rede. Estes princípios são o que o autor considera como os “segredos íntimos a serem desvendados” para que se possa conhecer o MST.
Apresenta sete valores enfatizados na luta, a saber: solidariedade, beleza, valorização da vida, gosto pelos símbolos, gosto de ser povo, defesa do trabalho e do estudo e, por fim, a capacidade de indignar-se. E, em função da práxis do Movimento dez lições são enfatizados: que a militância faz-se pela prática, pela experiência, pela ciência, pela cultura, pela disciplina, pelo exemplo, pela convivência e a partilha, pelo espírito de sacrifício, pelo trabalho produtivo e pela crítica e auto-crítica.
No tópico “Buscando outros caminhos” ele afirma que o “MST percebido como um movimento social de massa, não foi gradativamente se transformando em uma organização social de massa, mas sim foi adquirindo um caráter similar ao de uma sociedade em rede (...)”. E que a questão central na compreensão do MST é menos a razão, e sim o movimento de emancipação social (...). Daí a busca da auto-consciência, auto-determinação e da auto-realização.
Apresenta como hipótese que o MST tem mais uma feição de rede do que de uma organização social de massa. E conclui afirmando que “(...) o socialismo, e os valores que intrinsecamente pressupõe, já não mais assustam ou desmobilizam amplas parcelas das classes subalternas no campo, hoje identificadas socialmente como sem-terra”.

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